Aprovada a escolha da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados e do Senado Federal vislumbra-se um céu de brigadeiro para as pautas do Executivo, em comum acordo com o Legislativo.
Entre elas se encontra, a aprovação pelo Colégio de líderes da Câmara de Deputados, em 04/02/2021, da pauta que será discutida na próxima semana, como por exemplo: a autonomia do Banco Central (PLC 19/2019), medidas para prevenção do super endividamento (PLP 3515/2015) e incriminação dos fura-filas de vacinas (PL 25/21).
Como um bruxo, estou redigindo este artigo, que será publicado na 4a. feira, situação em que o PLC 19/2019, da autonomia do BACEN e sobre a nomeação e exoneração de seu Presidente e Diretores, que já foi aprovado no Senado, e já pode ter sido votado no dia anterior ou estará em análise pela Câmara de Deputados, no dia 10/02/2021.
Faz-se necessário fazer um esclarecimento de que existe um PLP 112/2019, de autoria do Poder Executivo, na Câmara dos Deputados, que trata da autonomia técnica, administrativa, operacional e financeira do BACEN, bem como define objetivos e altera a Lei 4.595/64. No entanto, tal proposta que ainda vai a plenário, não foi dada prioridade pelo Presidente da Câmara, Arthur Lira, a qual deve ser apensada ao PLC 19/2019.
Outro fator que merece consideração ao projeto de autoria do senador Plínio Valério (PLC 19/2019) é a diferenciação de autonomia e independência do BACEN. Segundo o parlamentar, o projeto não torna independente o BACEN, mas sim dá autonomia às decisões do Presidente do BACEN, de forma que não venha a ser demitido da noite para o dia, em uma nítida interferência do Executivo.
Entretanto, considero importante a definição dos conceitos de autonomia e independência existentes em uma apresentação em PowerPoint, de 24.04.2019, do Diretor de Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos Corporativos do BACEN, Tiago Berriel, existente na Internet:
- Autonomia é capacidade de tomar e manter decisões, e liberdade para definir como atuar para atingir as metas e objetivos estabelecidas;
- Independência – poder para definir, eles próprios, suas metas e objetivos; que tem liberdade operacional para decidir como atuarão para atingi-las; e cujas decisões não poderão ser revertidas pelos governantes.
No PLC 19/2019 consta que, o objetivo principal do BACEN é a estabilidade de preços e objetivo secundário, suavizar as flutuações do nível de atividade econômica e zelar pela solidez e eficiência do Sistema Financeiro Nacional.
Consta do Projeto de Lei Complementar que as metas de política monetária serão estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional, competindo privativamente ao BACEN conduzir a política monetária necessária para cumprimento das metas estabelecidas.
Uma das grandes diferenças entre o Projeto do Senado e o Projeto do Governo é a de que o primeiro inclui uma subserviência do Presidente do Banco Central à arguição pública, no primeiro e segundo semestres de cada ano, quanto aos relatórios de inflação e estabilidade financeira, explicando as decisões tomadas no semestre anterior. Enquanto o projeto do Executivo dá instrumentos de transparência e prestação de contas da estabilidade monetária e financeira da gestão do BACEN mediante relatórios e comunicados a serem disponibilizados ao público através de meios eletrônicos.
Inclusive na proposta do Executivo há uma isenção de responsabilidade dos atos praticados no exercício de suas atribuições pela Diretoria do BACEN e funcionários de carreira, exceto as hipóteses de dolo e fraude, não contempladas na proposta do Senado.
Sabe-se que a o Presidente do BACEN comparece regularmente ao Congresso, em especial a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado (CAE), a qual é responsável por proposições ligadas ao sistema financeiro e pareceres relativos à nomeação de Diretores.
Em época de governo de coalizão havia um relaxamento dos pareceres do CAE, de maneira a aquiescer com burocratas do BACEN, transferindo-se a responsabilidade para CPIs que faziam com que o BACEN antecipasse as ações do Senado. Esta consideração foi externada no trabalho de dissertação para Mestrado em Ciência Política na UnB, de 2006, de autoria de Sônia Rabelo Figueiras Lima, com o título “Autonomia do BACEN: as tensões que obstruíram a sua formalização no Governo FHC”.
Isto na visão econômica é um papel deletério do Senado em relação à cobrança de relatórios e arguição pública, ao invés da transparência e prestação de contas.
Segundo o PLC 19/2019 prevê-se uma relativa autonomia administrativa, técnica e operacional, transformando o BACEN em autarquia de natureza especial, não se subordinando a nenhum Ministério.
Existem críticas a esta relativa autonomia do BACEN quanto à políticas ineficientes do agente monetário que estariam descoordenadas de políticas fiscais não recessivas. Tal análise foi objeto de publicação no Brazilian Business Law Journal, do Centro Universitário de Curitiba, v.3, nr. 23/2020, págs. 105/121, de vários autores, com o título “A autonomia do BACEN como forma de regulação econômica”.
O art. 3o. e 4o. do PLC prevê que a Diretoria do BACEN será composta do Presidente e 8 Diretores, todos nomeados pelo Presidente da República, após aprovação de seus nomes pelo Senado, em sabatina, entre brasileiros idôneos, de reputação ilibada e de notória capacidade em assuntos econômico-financeiros.
Entendo desnecessário o Senado Federal achar por bem, publicar o currículo dos Diretores do Banco Central de forma a garantir maior transparência, isto é um ato para execrar servidores públicos.
O mandato do Presidente do BACEN será de 4 anos, tendo o início no 3o. ano do mandato do Presidente da República, enquanto o mandato dos Diretores também terão a duração de 4 anos, mas as nomeações serão intercaladas, 2 Diretores no 1o. ano do mandato do Presidente da República, 2 Diretores no 2o. ano, e assim sucessivamente. Há a possibilidade de recondução, apenas uma vez, por decisão do Presidente da República.
Apenas o mandato do Presidente do BACEN é diferente na proposta do Executivo, uma vez que se inicia no 2o. ano do mandato presidencial, vislumbrando um descolamento do período eleitoral, da questão da vontade popular.
As motivações das exonerações dos Diretores e Presidente do BACEN poderão ser: a pedido; por enfermidade que os incapacite para o exercício do cargo; por decisão transitada em julgada de Colegiado de ato de improbidade administrativa; e por último, por comprovada deficiência para exercício do cargo em contraposição aos objetivos da instituição.
Esta última motivação é de competência do Conselho Monetário Nacional, de submeter ao Presidente da República, que fica condicionada a aprovação, pela maioria absoluta do Senado.
O PLC 19/2019 proíbe o Presidente e Diretores do BACEN de: exercerem qualquer cargo ou função pública, exceto de professor; manter participação acionária em instituição do Sistema Financeiro Nacional (SFN) sob fiscalização do BACEN, incompatibilidade que se estende ao cônjuge e aos parentes até 2o. grau; e por último, estabelece uma quarentena de 6 meses, após o exercício do mandato, tanto a pedido, como por demissão justificada, de participação através de controle acionário ou exercer atividade profissional, diretamente ou indiretamente, com ou sem vínculo empregatício, em instituição do SFN.
Também atualiza as competências privativas do BACEN, previstas na Lei 4.595/64, permitindo que a instituição aprove regimento interno e efetue, como instrumento de política cambial, operações de compra e venda de moeda estrangeira, e operações com instrumentos de derivativos no mercado interno.
Concluo dizendo, além de todas as considerações já colocadas no artigo, que o Conselho de Controle de Atividades Financeiro, COAF, órgão subordinado administrativamente ao BACEN, dotado de autonomia técnica e operacional, responsável principalmente pelo combate e prevenção à lavagem de dinheiro, vem sendo submetido a gestões políticas de diversos órgãos, inclusive o Judiciário, fazendo com que a autonomia do BACEN seja considerada meia boca, um tremendo calcanhar de Aquiles.
Luiz Antônio Santa Ritta, para Vida Destra, 10/12/2021.
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Obrigado por colocar sua visão neste tema. É algo que precisarei pesquisar mais um pouco
Obrigado, Nunes!. A mudança seria completamente diferente se o Banco Central se tornasse independente.
Sinceramente, para emitir algum parecer eu precisaria me aprofundar muito. Sei, por experiência profissional, inclusive, que esses conceitos de autarquias e agências independentes e com mandatos defasados dos cargos eletivos somente funcionam em países que possuem políticas e estratégias de longo prazo e as seguem. Por aqui, tendem a gerar mais conflitos que soluções. Se tivesse que opinar, agora, seria favorável a total independência por questões de aumentar a credibilidade internacional, mas sei que, no futuro, poderá haver conflitos pelo aparelhamento desses órgãos. No Brasil não se consegue ter instituições de Estado e de Governo separadas, à exceção das Forças Armadas e Política Federal.
A independência seria um total descontrole para o Governo, fixando a seu bel prazer a política monetária. Já a autonomia restringe a interferência política na indicação do Presidente e Diretores do BACEN.
Grato!!!