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Política

Máscaras que desMOROnam

É um tanto quanto chato falar de novo desse assunto, mas dadas as proporções que ele atingiu, não poderia me esquivar, ainda que já tenha sido abordado por diversos outros jornalistas, as declarações dadas pelo ex Ministro da Justiça Sérgio Moro sobre tentativas de o Presidente Jair Bolsonaro interferir na Polícia Federal jogaram uma bomba no Brasil e aprofundaram ainda mais a crise política que o país tenta superar desde 2015, quando fora iniciada. As acusações de Moro até agora não foram provadas, mas já foram o suficiente para abalar o apoio ao governo conservador de Jair Bolsonaro, que dera o primeiro passo para trazer de volta as direitas ao poder e consertar o que os danos que anos de governo de esquerda causaram na moralidade, educação, política, cultura e outras áreas.

Tudo começou no dia 24 de abril de 2020, na coletiva que Moro convocou e disse, aos 26 minutos, que “foi cogitado o nome do atual diretor da ABIN para a direção da PF, que é um bom nome”. O atual diretor da ABIN, à época, era ninguém mais ninguém menos que Alexandre Ramagem, o atual diretor da PF, que substituiu Valeixo, ou seja, é um bom nome e até o até então Ministro reconheceu isso. Ele diz, ainda, que Bolsonaro queria “uma pessoa que pudesse ligar para colher informações e relatórios de inteligência” e não há nada de ilegal nisso, visto que “informações” é um termo genérico que pode designar desde informações sobre inquéritos, algo que seria de fato vedado, mas que não foi dito, até informações sobre a gestão macro da organização, algo liberado, porém, o diretor não tem acesso aos inquéritos, que são conduzidos por delegados concursados ao redor do país. E o que Bolsonaro ganharia ao pedir informações sobre inquéritos? Proteção a Flávio Bolsonaro? Isso é falso, pois ainda que a PF possa fazer investigações sobre deputados e senadores, quem abre o processo contra eles é o PGR, indicado pelo Presidente da República, que leva o processo ao STF, o mesmo tribunal que investigou apenas 500 parlamentares desde 1988, mas condenou apenas 16, sendo o primeiro deles em 2010, deixando clara a sua leniência para com crimes do colarinho branco

Moro também reclamou que não estava tendo carta branca, pois o Presidente queria trocar o diretor da Polícia Federal, que desde 2019 disse estar “cansado” de estar no cargo, algo que saiu até no Estadão, que diz que segundo o próprio Valeixo, sua saída não tem nada a ver com inquéritos que poderiam incomodar o Presidente Jair Bolsonaro. Acontece que a carta branca tem limites tanto legais quanto democráticos. O que Moro chamou de “intervenção política” na PF nada mais é do que a atribuição do Presidente da República, segundo o artigo 2C da Lei 9266, e não do Ministro da Justiça, de nomear o diretor geral da Polícia Federal. Em momento algum Moro disse que o Presidente queria um diretor na PF que lhe passasse informações sigilosas sobre as investigações de Flávio Bolsonaro ou de quaisquer aliados e se Bolsonaro cedesse atribuições suas a Sérgio Moro, poderia ser acusado de descumprir a lei e posteriormente sofrer uma ação penal ou impeachment por isso, visto que, segundo o princípio da legalidade que vigora no ordenamento jurídico brasileiro, o agente público está vinculado à lei e deve, portanto, fazer apenas o que ela diz, não podendo se desviar daquilo que foi escrito ou decidido por tribunais em alguma interpretação cujo objetivo é esclarecer um ponto ambíguo.

Após o Presidente ter desmentido as acusações de Moro em pronunciamento, o ex Ministro da Justiça mandou ao Jornal Nacional prints de conversas de whats app que teve com Bolsonaro. Nessa conversa, Sérgio Moro envia uma notícia de que a PF está na cola de 10 a 12 deputados bolsonaristas do site O Antagonista para o Presidente, que responde “mais um motivo para a troca”, em alusão ao diretor da Polícia Federal. Moro então explica que esse inquérito da PF é conduzido pelo Ministro Alexandre de Moraes (que inclusive, escolheu a dedo os delegados que estão atuando nesse processo), do STF, não por Valeixo, que era o diretor na época. Porém, do que se trata esse inquérito? É o chamado “inquérito das ‘fake news’“, que visa investigar, dentre outras, aquela notícia que saiu na Crusoé e no Antagonista em 2019, que Marcelo Odebretch disse que o apelido “amigo do amigo do meu pai” era de ninguém mais ninguém menos que Dias Toffoli, Presidente do Supremo Tribunal Federal, colega de classe Alexandre de Moraes quando estudaram na USP, na década de 90. A abertura desse inquérito, cujo objetivo é censurar a liberdade de expressão e blindar o STF de quaisquer investigações e questionamentos, levanta a reflexão: quem controla o Executivo Federal? Câmara e Senado, no âmbito político, e o Supremo Tribunal Federal, no âmbito jurídico. Quem controla a Câmara e o Senado? O Supremo Tribunal Federal. E quem controla o Supremo Tribunal Federal? Na teoria, era para ser o Senado Federal, mas na prática, com os Presidentes da Casa com processos parados na Corte, ninguém, pois isso torna-se impossível, o que faz do STF uma instituição com poderes quase que ilimitados, visto que seus membros sequer têm mandatos de tantos anos, como o Presidente, para que pelo menos um controle temporal fosse imposto a eles. Não é à toa que o STF comete diariamente todo o tipo de barbaridade, como um de seus ministros mandar prender num avião um homem que disse “ter vergonha da Corte”, e continua sem sofrer nenhuma punição ou questionamento por parte das autoridades. Uma das provas que o STF comete barbaridades e não é questionado é esse inquérito das fake news. Via de regra, quem abre inquérito é as Polícias Civis e Federal, mas o regimento interno do STF diz que se um crime acontecer nas dependências dele, o Presidente da Corte pode designar ministros para presidir um inquérito sobre esse crime. Vamos supor que Toffoli não seja o “amigo do amigo do meu pai” citado por Marcelo Odebretch e que essa seja uma notícia falsa que também é um crime de calúnia contra o ministro indicado por Lula em 2009. Essa notícia não foi publicada de dentro do Supremo Tribunal Federal, foi publicada na redação da revista Crusoé e do Antagonista. Observe que Sérgio Moro se indignou com o Presidente porque supostamente ele queria trocar o diretor da PF para saber mais sobre um inquérito ilegal, que não é questionado por nenhuma autoridade da República, mas não se indignou com esse inquérito, muito pelo contrário, fez vista grossa e não tomou nenhuma medida para proteger os investigados ilegalmente ou para questionar o Supremo.

Mas talvez nada tenha sido mais absurdo que o ex Ministro falar que “na época do PT não havia interferência na Polícia Federal”. Romeu Tuma Júnior, ex Secretário do Ministério da Justiça na gestão do PT, escreveu com o jornalista Claudio Tognolli o livro Assassinato de Reputações – Um Crime de Estado, em que denuncia o aparelhamento do governo petista para cometer crimes, em especial pedidos heterodoxos feitos a ele quando trabalhou no Ministério. Nesse livro também são reveladas vezes que Lula trocou o diretor geral da PF, o que já refuta as declarações de Moro. Mas, claro, tais interferências também ocorreram no governo Dilma: em delação, Mônica Moura, esposa do marqueteiro do PT João Santana, revela que Eduardo Cardozo, ex Ministro da Justiça de Dilma, passava informações à Presidente sobre a Lava Jato. Mônica diz que “A Presidente nunca me falou como o Eduardo obtinha essas informações, só disse que o Zé Eduardo sabia dos passos da operação Lava Jato” nos 3 minutos e 30 segundos de sua delação, que você pode conferir aqui.

Por fim, as minhas impressões sobre todo esse ocorrido são as seguintes: Bolsonaro, na euforia de ter ganhado as eleições, convidou Sérgio Moro, que apesar de não ser conservador, fez um bom trabalho como juiz, para ser Ministro e tudo indica que lhe prometeu um cargo no Supremo Tribunal Federal, conforme o próprio Presidente afirmou em maio de 2019. Com o tempo, no entanto, o Presidente começou a perceber que Moro não era um conservador e que não estava alinhado com as pautas conservadoras de guerra cultural e combate ao socialismo, coisas que talvez nem acredite. Percebido isso, Bolsonaro mudou de postura e disse que indicaria ao STF um ministro “terrivelmente evangélico” ao Supremo, no segundo semestre de 2019, quando Moro disse que começou os conflitos sobre troca de diretor da PF. Sérgio Moro então percebeu que não ganharia uma vaga no Supremo e arrumou uma desculpa para sair e desestabilizar o governo inteiro, algo que beneficiou centrão, DEM e PSDB, os maiores inimigos da direita. Para resolver esse imbróglio, o Procurador Geral da República, Augusto Aras, pediu inquérito no STF para que Sérgio Moro prove todas as acusações que foram feitas por ele ao Presidente na coletiva. Esse inquérito poderá desaguar ou numa condenação de Sérgio Moro por calúnia ou denunciação caluniosa, ou na prova de que o Presidente Bolsonaro realmente queria interferir na PF para proteger aliados, o que é difícil, visto que a nomeação do diretor cabe por lei a ele. De qualquer forma, Maia sai fortalecido, por isso, é mais que necessário continuar as manifestações contra o Presidente da Câmara, o inimigo número um do Brasil que atrasou diversas reformas e que parte da direita esqueceu.

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