Existe um consenso no mundo político sobre as CPI’s: sabemos como começam, mas não como terminam. Talvez por isso, todos os Governos se desdobram para evitar a instalação de qualquer CPI, uma vez que invariavelmente elas também se prestam para palanque de adversários políticos do governo de plantão.
Mas vale lembrar que houve casos na história recente em que CPIs foram instrumentos importantes de investigação, pois propiciaram a punição de corruptos e a correção de práticas no trato com a coisa pública. Podemos citar como exemplo a CPI dos Anões do Orçamento, em 1993 e a CPMI do Mensalão em 2005.
Cresce no Congresso Nacional a pressão pela criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar ações relacionadas às medidas de enfrentamento à crise sanitária causada pela pandemia do novo coronavírus. A lógica parece justa, porém, diante da evidente politização em relação ao tema, é preciso que isso ocorra de forma adequada.
A CPI ora requerida foi assinada por vários senadores, a maioria de oposição ao Governo, mas também por parlamentares de partidos da base. O fato determinado para abrir a comissão é “investigar as ações e omissões do Governo Federal no enfrentamento da pandemia da Covid-19 no Brasil e, em especial, no agravamento da crise sanitária no Amazonas com a ausência de oxigênio para os pacientes internados”.
O foco da CPI apenas nas ações ou omissões do Governo Federal são uma clara tentativa de colocar o Presidente Bolsonaro no epicentro das responsabilidades de toda essa questão. Ocorre que já está sobejamente comprovado que, se houve erros na condução do Governo Federal nessa crise, tão ou mais responsáveis são os gestores locais, governadores e prefeitos.
Como ignorar as fraudes de milhões ocorridas em alguns Estados? Como ignorar os gestores locais – governadores e prefeitos – que foram alvos de operações da Polícia Federal, em função dos vultosos desvios na compra de respiradores, leitos de UTI e equipamentos diversos para uso das equipes de saúde? É mesmo plausível que qualquer investigação decente deixe de fora todo esse contexto?
Entendo que para ser coerente, qualquer CPI que se pretenda criar sobre essa crise, deve contemplar a atuação de todos os agentes públicos envolvidos em possíveis irregularidades em contratos, fraudes em licitações, superfaturamentos, assinaturas de empresas de fachada, enfim, todos os ilícitos cometidos com recursos originados da União.
Solicitação nesse sentido foi apresentada pelo Senador Eduardo Girão (PODEMOS-CE) e também espera a coleta de assinaturas mínimas. Por coerência, todos que assinaram a primeira CPI deveriam assinar essa mais ampla também, sob pena de serem vistos como oportunistas que tentam politizar ainda mais tudo que diz respeito a essa questão.
Do ponto de vista do Governo Federal, seria importante também que assumisse as rédeas dessa narrativa e fizesse valer a sua maioria, não para barrar a CPI, mas para viabilizar que seja criada a CPI que, de fato, investigue todos os aspectos e atores dessa crise. Ao invés de gastar capital politico barrando uma investigação, e com isso, dar munição aos que querem culpá-lo solitariamente pelo caos que a pandemia causou, faça do limão uma limonada!
Dobre a aposta, permita a investigação, comprove que fez os encaminhamentos corretos e dentro daquilo que lhe foi permitido pelas decisões do Supremo Tribunal Federal. Depois, basta inverter o ônus da questão e expor todos aqueles que precisam explicar o que fizeram com os recursos que foram enviados pelo Governo Federal, e foram mal geridos ou desviados para outras finalidades, inclusive a corrupção. Não há espaço mais adequado para isso do que uma CPI.
Portanto, se conduzida da maneira correta, uma CPI pode ajudar a elucidar os fatos, expor as narrativas fraudulentas e restabelecer a verdade acerca das responsabilidades. Assim, saberemos quem realmente tem medo de CPI. E eu tenho um palpite de que não deve ser o Governo Federal.
Ismael Almeida, para Vida Destra, 15/03/2021.
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Excelente artigo de @Ismael_df em que indaga quem tem medo de CPI. Embora eu seja contra, uma desvia da atividade típica do parlamentar de legislar. Mas fiquei com uma curiosidade, se possível, vce possa esclarecer aos nossos leitores do @vidadestra, quantas assinaturas são necessárias p/instalação de uma CPI e quantas de uma CPMI?
Prezado Luiz, embora não seja a atividade principal, a investigação é uma das funções típicas do Parlamento. E às vezes elas se tornam inevitáveis. E por isso, defendo que devam ser direcionadas para o melhor resultado possível. Quanto às assinaturas, são necessárias 1/3 dos membros da respectiva Casa. No caso do Senado, então, 27.