Privatização é a transferência dos bens e da titularidade da exploração da atividade de uma empresa estatal para uma empresa privada com o objetivo de levantar caixa para o estado, permitir que a empresa privatizada invista melhor ou qualquer outro motivo. No Brasil, o programa de privatizações começou de fato no governo Collor, pressionado pelo consenso de Washington, um conjunto de regras criadas pelo FMI no final dos anos 80 para facilitar o empréstimo deste banco a países que precisassem, porém, no governo Collor, as privatizações não decolaram devido ao fato de ele ter se envolvido em diversos escândalos e acabar com o seu capital político com o Congresso e posteriormente ter renunciado para não sofrer impeachment. As privatizações só deram um salto qualitativo mesmo no governo de Fernando Henrique Cardoso, um socialista fabiano que preferiu o pragmatismo quando assumiu o governo ao invés da utopia socialista que costumava defender quando era aluno da USP e, por isso, FHC foi taxado por anos como “neoliberal de extrema direita” por setores esquerdistas, mesmo ele tendo disputado as eleições da internacional socialista, tendo fundado o PSDB, partido com conceitos marxistas em seu estatuto (a prevalência do trabalho sobre o capital, que encontra-se no artigo segundo) e outras atitudes socialistas que tomou em seu governo, como a ampliação das ideias de Paulo Freire no âmbito da educação. Não faz o menor sentido associar FHC à direita pelo simples fato de ele ter privatizado empresas estatais uma vez que Lênin, líder da Revolução Russa de 1917 que conduziu aquele país ao comunismo, ao assumir o governo, implementou uma política econômica mais capitalista do que socialista, pois viu que não havia condições de se fazer socialismo sem riqueza na época. Tanto a política de Lênin – conhecida como NEP – quanto a política de privatizações de FHC estão em perfeita consonância com as ideias de Marx, que dizia que para o advento do socialismo, seria necessário levar o capitalismo às suas últimas consequências para gerar-se a riqueza necessária.
Independentemente de FHC e Lênin, vamos entender o porquê das privatizações serem não só necessárias, como também urgentes para que o país cresça e retome os investimentos privados que dão continuidade ao processo de civilização, o qual melhora a vida dos indivíduos e gera cada vez mais riquezas na forma de produtos, serviços e tecnologias que aprimoram processos já existentes.
O primeiro passo é entender o que é e quais as diferenças entre propriedade privada e propriedade pública. A propriedade privada trata-se do resultado de um ato de apropriação original (isto é, você se apropriar de algo que não pertence a ninguém), de produção (isto é, você pegar uma série de matérias primas suas e transformá-las, através de um processo, em um produto novo, como ocorre com celulares, carros, construções e quaisquer outros bens), troca (isto é, você tem uma coisa e troca essa coisa por outra com uma pessoa que queira a sua coisa) ou transferência (que é a doação ou a herança, por exemplo). O resultado desse ato, seja em qual forma for, lhe permite exercer jurisdição sobre a sua propriedade, ou seja, permite você escolher o que quer fazer com ela e quem pode ou não usa lá. Por exemplo: você pode escolher quem pode entrar ou não na sua casa, usar o seu carro, usar um bem seu, como, seu telefone celular etc.
Já a propriedade pública, a exemplo de uma Universidade Federal, trata-se de uma propriedade privada, porém do estado, dando ilusão de que ela é de todas as pessoas, o que é um ledo engano, uma vez que se isso fosse verdade, todas as pessoas poderiam exercer jurisdição sobre ela e como a propriedade pública é, em teoria, de todos de forma igual, não é possível que ninguém exerça tal jurisdição, pois a mera tentativa de exercê-la vai gerar um conflito insolúvel com os interesses dos outros “donos”. Isso acontece também porque a propriedade “pública”, que na verdade é uma propriedade privada do estado, foi construída com dinheiro de impostos e na cobrança de impostos é simplesmente impossível determinar o quanto de imposto que cada um pagou foi utilizado para a construção daquela propriedade, destruindo qualquer possibilidade de saber quem de fato é mais dono e menos dono. Nota-se então que a propriedade pública não passa de uma distorção do conceito de propriedade privada, visto que é impossível associá-la aos seus verdadeiros donos que pagaram para construí-la e é impossível, mesmo que você tenha pagado o maior valor para construí-la, exercer qualquer jurisdição sobre ela, como, por exemplo, vender a sua participação para outra pessoa, o que prova de uma vez por todas que a propriedade pública não é “de todos”, na verdade não é de ninguém, mas sim do estado. Tendo as diferenças e definições em vista, serão mostradas as consequências nefastas que a ideia de propriedade pública causa na sociedade através das empresas do governo.
A importância da propriedade privada é que ela conduz ao cálculo econômico eficiente na sociedade, o que significa que, quando uma pessoa é dona de uma empresa, ela vai fazer de tudo para prestar o melhor serviço pelo menor custo para aumentar seu faturamento. Esse faturamento alto vai permitir que o dono da empresa, logicamente de propriedade privada, procure aumentá-la cada vez mais para ganhar cada vez mais dinheiro e neste processo, milhares de pessoas serão contratadas, milhares de produtos e serviços de outras empresas serão adquiridos, o que vai beneficiar essas outras empresas e pessoas indiretamente, pois pessoas terão de ser contratadas por essas outras empresas devido à alta da demanda, e um processo de civilização é iniciado por haver a propriedade privada. Um bom exemplo é a empresa Vale, que em 97, antes de ser privatizada, tinha lucro de 325 milhões de dólares. 6 anos depois, seu lucro passou a ser 1,5 bilhão, em 2003, e em 2018, este valor passou para 25 bilhões de reais, ou, 6,2 bilhões de dólares. Além disso, antes de ser privatizada, a Vale empregava aproximadamente 15 mil funcionários, contando com os cabides de empregos políticos. Hoje, nas mãos da iniciativa privada, ela emprega aproximadamente 75 mil pessoas, sem cabides de emprego, apenas com profissionais competentes, dado que a atividade da empresa exige pessoas altamente capacitadas, o que favorece aqueles que estudaram bastante para se tornar bons profissionais na área de engenharia, tecnologia, direito, economia e também os técnicos.
Por outro lado, empresas que se mantiveram nas mãos do estado, como os Correios, amarguraram diversos revezes, como, por exemplo, prejuízos bilionários sob um regime de monopólio (isto é, sem pagar diversos impostos) na era Dilma Rousseff, quando a empresa tinha aproximadamente 6 vices presidentes e nenhum deles entendiam o básico de logística. Além disso, o número de funcionários da estatal é preocupante: ela não realiza concurso público desde 2011, quando teve o último, que venceu em 2015. Desde então, a empresa só tem diminuído o número de funcionários, o que explica o grande número de reclamações, fora as decisões burras. É comum comprar um produto em São Paulo que precisa ser entregue em Brasília e esse produto ficar “viajando” pelo Brasil, isto é, vai para Recife, vai para o Pará, vai para Minas Gerais para depois ir para Brasília, revelando a incompetência por trás da gestão pública que logicamente não é feita por um gestor que entenda de logística. Outro grande problema dos Correios e de empresas estatais no geral é a corrupção: em 2005 foi descoberto que dinheiro era desviado dos Correios e do Banco do Brasil para comprar votos de deputados para que aprovassem projetos do governo Lula, sendo esse escândalo conhecido como mensalão. Mais tarde foi descoberto um esquema de corrupção na Petrobrás que fez o mensalão parecer roubo de galinha: o Petrolão ou operação Lava Jato, envolvendo os mesmos partidos que estavam envolvidos no mensalão e em outros esquemas criminosos, como o Banestado. Eis aí outro ponto positivo da privatização: a corrupção é reduzida. É verdade que há corrupção em empresas privadas que realizam contratos com o governo, como Odebretch, OAS e muitas outras que foram pegas na Lava Jato, mas a única corrupção possível de acontecer nessas empresas é a corrupção ativa, isto é, elas aceitarem propina do governo ou oferecerem propina para funcionários públicos beneficiá-las. Na empresa estatal é possível haver, além da corrupção ativa, a corrupção passiva também, que é o funcionário público solicitar ou receber propina.
A esquerda argumenta que não é necessário privatizar uma empresa estatal para que ela seja bem gerida. Isso em partes é verdade, visto que notou se uma boa gestão dos Correios no governo Michel Temer, que inclusive fez com que a empresa parasse de dar os bilionários prejuízos, e nota-se também uma excelente gestão de estatais como Correios, Petrobrás, Banco do Brasil e todas as outras agora, no governo de Jair Bolsonaro, que indicou grandes nomes respeitados pelo mercado para gerir essas companhias. No entanto, como já explicamos aqui no Vida Destra, o sistema de governo Republicano, em contraste com o sistema Monárquico, não é um sistema de governo de propriedade privada, mas sim de propriedade pública. Isso significa que, hoje, com Bolsonaro, as empresas estatais dão altos lucros, é verdade, mas, amanhã, a esquerda pode voltar ao poder (ou algum presidente de direita que seja corrupto) e começar todo o processo de corrupção de novo. Além disso, outro problema de se manter as empresas estatais nas mãos do estado, por melhor que elas sejam geridas, é que todas as empresas, públicas ou privadas, estão sujeitas ao dinamismo do mercado, o que significa que por algum revés, como, por exemplo, a criação de uma nova tecnologia, aquela empresa pública que antes dava altos lucros comece a dar prejuízos. Para manter essa empresa estatal dando prejuízo, o governo irá mandar a conta para o contribuinte, que muitas vezes nem usa o serviço daquela estatal, mas acaba pagando por ela mesmo assim, sob o argumento dela ser “estratégica”, um eufemismo para justificar que empresas não sejam privatizadas. O governo poderá extingui-lá também, mas, para isso, precisará da aprovação do Congresso, composto por Câmara e Senado, em um debate que durará meses e pode nem ser aprovado, visto que a empresa estatal, ainda que dê prejuízos, é boa para que políticos indiquem seus afiliados em troca de vantagens indevidas. Um outro ponto interessante de se mencionar é que as estatais estão sujeitas ao regime de direito público e não ao regime de direito totalmente privado, como as empresas privadas. Isso significa que as empresas do estado têm que seguir uma série de burocracias que impactam negativamente em suas atividades, como, por exemplo, contratação via concursos públicos, estabilidade de funcionários, obrigação de fazer licitação, obrigação de prestar contas ao Tribunal de Contas do respectivo ente (no caso de Correios e Petrobrás, ao TCU – Tribunal de Contas da União –, por serem federais) etc.
Os super salários também são outro problema das empresas estatais em face às empresas privadas. O responsável por definir preços e salários é o mercado, por isso, todos os cargos na iniciativa privada, do estagiário ao diretor, ganham quase a mesma coisa, levando em consideração o tamanho, localização e capacidade de lucro da empresa. Já no serviço público, verifica-se salários três vezes maiores pagos a funcionários que fazem a mesma coisa na iniciativa privada e detalhe: com a empresa estatal dando prejuízo, ou seja, não basta a empresa dar prejuízo, ela tem que continuar pagando um super salários aos seus funcionários com o dinheiro do povo, algo que nunca aconteceria na iniciativa privada, onde a empresa que é mal gerida sofre com a punição da falência, não obrigando pessoas que não usam seus serviços a financiarem compulsoriamente os prejuízos.
As privatizações, sobretudo, melhoram a avaliação internacional do país em agências de riscos, como a Fitch e S&P, que entendem perfeitamente que manter empresa nas mãos do governo não é uma boa ideia por causa dos motivos citados acima e de muitos outros complexos que serão futuramente apreciados e detalhadamente explicados. A consequência do melhoramento da avaliação internacional nessas agências é a maior geração de empregos devido ao aumento de investidores dispostos a financiar a atividade empreendedora nacional, o que significa, necessariamente, o aumento de renda em todo o país, porque se mais dinheiro chega nas empresas, mais rápido elas expandirão as suas atividades e farão com que o mundo “vá girando cada vez mais veloz”, como diz o cantor Lenine na música Paciência, que nada tem a ver com privatização, mas que é uma metáfora que serve para entender melhor esse processo.
A esquerda é contra a privatização porque diz que ela prejudica os pobres por supostamente acabar com o ‘serviço público’ (que na verdade vira serviço privado), mas é mentira, uma vez que o serviço público é pago e paga-se caro por ele, pois o governo, que é o administrador da empresa estatal, não tem a dinâmica que o mercado tem de prestar o melhor serviço possível pelo menor preço a fim de maximizar os lucros, porque, caso a empresa estatal dê prejuízo, o governo não terá que arcar com ele, mas sim mandar a conta para a população pagar, o que é muito mais fácil. Com a conversão de serviço público para serviço privado, aumenta-se a qualidade e diminui-se o preço, a exemplo da telefonia, que antes da privatização, pela péssima gestão que era feita, era uma exclusividade da classe alta. A esquerda ainda diz que não se pode vender “as empresas do povo”, o que é uma falácia criada por sindicatos e repetida à exaustão por militantes dessas instituições, visto que foi provado aqui que a propriedade “pública” não pertence ao povo, mas sim ao estado. A privatização só é prejudicial para meia dúzia de pessoas do núcleo político que controla essas empresas através de cargos comissionados que são usados como moeda de troca e essa meia dúzia sempre fará de tudo para impedi-la, pois sempre será mais fácil viver às custas dos que trabalham do que se arriscar no mercado utilizando sua própria mão de obra e conhecimentos.
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Só posso dar meus parabéns pelo trabalho realizado pelo Vida Destra. Acredito num Brasil melhor para todos. A hora agora é de muito trabalho para resgatar 25 anos perdidos em defesa mentirosa e insana dos mais pobres. Temos que melhorar a educação no que for possível no momento e investir pesado na educação básica (desde a pré escola), pública e de muita qualidade onde estudem os ricos e os menos favorecidos lado a lado. Assim ao final dos próximos 25 anos, contando evidentemente com todo o potencial econômico deste nosso querido Brasil, seremos a nação próspera e igualitária que todos… Read more »
Agradeço em nome da equipe Vida Destra.
Comentários assim, são como combustível para a gente.
Parabéns! nunca tinha lido uma explicação tão lúcida e de facil percepção do assunto.