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O sistema é bruto! Será que, a exemplo de Deltan Dallagnol, tornarão Bolsonaro inelegível?

Como vingança do Molusco ao Power Point das investigações da Lava Jato apresentadas pelo ex-procurador da República, da Força-Tarefa de Curitiba (PR), Deltan Dallagnol, o TSE cassou, por unanimidade, o registro do deputado federal do Podemos-PR, no dia 16 de maio de 2022, com base em uma exegese, hermenêutica ou interpretação das mais descabidas.

Neste particular, analisaremos a cassação do deputado estadual Fernando Francischini (PSL-PR), da atual inelegibilidade de Dallagnol e, também, da possível perda do direito de ser votado do ex-Presidente Bolsonaro nas eleições de 2026. Parece que estou vendo uma reprise da série modificadaO Mecanismo” e do filme “Polícia Federal – A LEI É PARA TODOS”, em que procuradores e juízes só entram pelo cano.

Inicialmente, traremos para a análise a cassação do deputado estadual Fernando Francischini, em que é necessário ter conhecimento do princípio da anualidade eleitoral, dispositivo expresso na Constituição Federal, que veda mudanças no processo eleitoral até 1 ano do pleito, conforme abaixo:

Art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até 1 (um) ano da data da sua vigência.

O acórdão prolatado no Recurso Ordinário – Ação de Investigação da Justiça Eleitoral RO-AIJE 0603975-98.2018.6.16.0000, publicado em 07 de dezembro de 2021, cassou o deputado estadual Fernando Francischini por uma live no Facebook, vinte minutos antes do término do primeiro turno das eleições de 2018, na qual teria supostamente divulgado notícias falsas acerca do sistema eletrônico de votações. Será que a notícia teria o condão de mudar as eleições, a tão poucos minutos do fim do escrutínio, ao ponto de permitir que as “tias do Zap” disparassem mensagens freneticamente?

Basicamente, criaram uma Resolução do TSE — RESOLUÇÃO não é Lei (grifo meu) —, após as eleições de 2018, aplicando esta jurisprudência de dezembro de 2018 retroativamente, no julgamento em 2021, às Eleições de 2018, para incluir as redes sociais como meios de comunicação social para configuração do abuso de poder econômico.

Foi considerada, à época, um ineditismo da solução hermenêutica adotada pelo TSE, especificamente no voto do Relator, ministro Luís Felipe Salomão — responsável também pela desmonetização de canais. O raciocínio foi o seguinte: se as Eleições de 2018 representaram ruptura e marco, é evidente que se trata, portanto, de um momento de transição do processo eleitoral; se não foram modificadas as regras para se ajustar a essa nova realidade, deve-se então alterar a interpretação dada a elas, particularmente no que concerne à compreensão que se tem sobre “veículos ou meios de comunicação social”.  A interpretação nos casos de inelegibilidade não deveria ser restritiva?

Só ativando a memória dos nossos leitores de que Luís Felipe Salomão, atualmente no CNJ, responsável pela Resolução CNJ – 487/2023, que instituiu a política antimanicomial do Poder Judiciário, é também o candidato favorito do ministro Alexandre de Moraes para a vaga deixada no STF por Lewandowski.

Nos termos da jurisprudência prevalecente do TSE até o pleito eleitoral de 2018, os instrumentos de comunicação social, cujo uso indevido é sancionado pelo artigo 22 da Lei de Inelegibilidades (Lei da Ficha Limpa), são: jornais, revistas e emissoras de rádio e televisão:

Art. 22 – Qualquer partido político, coligação ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias, e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida para apurar o uso indevido de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político.

Nessa esteira, ao interpretar a norma contida no artigo 22 da Lei das Inelegibilidades, operou-se ampliação e abertura semântica, por analogia, para que as expressões meios de comunicação social passassem também a abranger a Internet e todas as tecnologias a ela associadas, em particular, as chamadas redes sociais.

A regulamentação do tema só se deu em 18 de dezembro de 2018, quando foi publicada a Resolução no 23.610, depois das eleições, com o seguinte teor: “O uso de aplicações de mensagens instantâneas visando promover disparos em massa, contendo desinformação e inverdades em prejuízo de adversário e em benefício de candidato pode configurar abuso do poder econômico e o uso indevido dos meios de comunicação social para os fins do art. 22, caput e inciso XIV da Lei Complementar 64/90”.

A inovadora hermenêutica alterou significativamente o processo eleitoral e, por essa mesma razão, deveria guardar obediência ao art. 16 da CF, de modo que alcançasse a eleição ao menos um ano depois da data de sua implementação, o que a considera inconstitucional para ser aplicada retroativamente mais de três anos depois de concluídas às eleições.

Já no caso de Deltan Dallagnol, trata-se da análise do Recurso Ordinário nº 061.407-70 – PR, apresentado pela Federação Brasil da Esperança (PT/PCdoB e PV) do Paraná, em que alega-se que o ex-procurador da República se desligou do cargo para evitar as punições que viria a sofrer com virtuais Processos Administrativos Disciplinares (PAD), em curso, que fatalmente causariam sua demissão ou aposentadoria.

Para relatar a ação, foi designado o ministro Benedito Gonçalves, corregedor geral eleitoral, aquele que recebeu um “tapinha não dói” no rosto, de Lula; aquele que disse ao Presidente da República: “Missão dada, missão cumprida”, e que também foi alvo de delação por parte da empreiteira OAS.

Antes de qualquer coisa, torna-se necessário trazer o dispositivo alvo da celeuma, o inciso “I-q” do artigo 1 da LC 64/90 (Lei da Ficha Limpa), que diz que são inelegíveis para qualquer cargo:

Os magistrados e membros do Ministério Público que forem aposentados compulsoriamente por decisão sancionatória, que tenham perdido o cargo por sentença ou que tenham pedido exoneração ou aposentadoria voluntária na pendência de procedimento administrativo disciplinar – PAD, pelo prazo de 8 (oito anos).

No caso em concreto, o ex-procurador da República deixou o Ministério Público Federal do Paraná em 03 de novembro de 2021, quando corriam contra ele 15 reclamações ou sindicâncias, que foram arquivadas, extintas ou paralisadas, com a sua exoneração.

“Será o Benedito” disse que Deltan burlou a lei. E “viajou na maionese” em uma conjectura, na qual vislumbrou que a “possibilidade” da reclamação poderia vir a tornar-se um PAD, e consequentemente resultaria em condenação, como causa de demissão.

Vejamos o que dizem os artigos 246, 247 da LC 75/93, que dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União:

Art. 246. A sindicância é o procedimento que tem por objetivo a coleta sumária de dados para a instauração, se necessário, de inquérito administrativo (grifo meu).

Art. 247. O inquérito administrativo, de caráter sigiloso, será instaurado pelo Corregedor Geral, mediante Portaria, em que designará comissão de três membros para realizá-lo, sempre que tomar conhecimento de infração disciplinar.

Art. 251. A Comissão encaminhará o inquérito ao Conselho Superior, acompanhado de seu parecer conclusivo, pelo arquivamento ou pela instauração de processo administrativo.

A exemplo da Ação Penal, em que é necessária a denúncia para que a investigação se torne um processo penal. No campo administrativo, a sindicância só se torna um inquérito administrativo mediante uma Portaria para, depois do crivo de uma Comissão, ou ser arquivada ou virar um PAD. Notem que não houve Portaria; Benedito deu um salto triplo da reclamação para o PAD.

Aliás, existe jurisprudência no Resp 0600957-30-PR, de relatoria do ministro Raul Araújo do TSE, na qual a Corte decidiu que a inelegibilidade da alínea “q” exige que tenha havido “processo administrativo disciplinar”, a ele não se equiparando reclamações e sindicâncias.

As sanções disciplinares previstas para membros do MP são: advertência, censura, suspensão, demissão e cassação de aposentadoria e de disponibilidade. Deltan Dallagnol, durante o exercício como procurador, só teve 2 processos, um de advertência e outro de censura, porque aventou neste último a hipótese de leniência no combate à corrupção por parte do senador Renan Calheiros, caso viesse ser eleito presidente do Senado. No que concordo com ele.

Afora isto, Deltan tinha uma certidão do próprio CNMP que dizia que ele era ficha limpa, fato que permitiu o registro de sua candidatura 9 meses depois, em 15 de agosto de 2022.

Inusitado é o TSE retirar os mandatos de 2 parlamentares que contavam com o parecer do TRE-PR contra a impugnação da candidatura, e, principalmente, ir contra a vontade popular, demonstrada em mais de 417 mil e 344 mil votos para Francischini e Deltan, respectivamente.

Entretanto, Deltan Dallagnol terá o direito de ampla defesa perante a Câmara dos Deputados, segundo o Ato de Mesa nº 37, que envolve a perda do mandato político, conforme o inciso V do artigo 55 e § 3o da Constituição Federal:

V – quando decretar a Justiça Eleitoral, nos casos previstos nesta Constituição;

§ 3º – Nos casos previstos nos incisos III a V, a perda será declarada pela Mesa da Casa respectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros, ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada a ampla defesa.

Claro que sou a favor da manutenção do mandato do deputado, embora não creia que a Mesa da Câmara vá salvar seu mandato, diante das inúmeras atitudes do presidente da  Câmara,  Arthur Lira, em que coordenou o parecer da deputada Magda Mofatto favorável à prisão do deputado Daniel Silveira, assim como permitiu que parlamentares utilizassem tornozeleira eletrônica na Casa do Povo, como no caso de Daniel Silveira e Zé Trovão.

Por outro lado, o ex-procurador da República  é um “santinho do pau oco”, já que apoiou o candidato da esquerda para a Procuradoria Geral da República, Mário Bonsaglia, conforme artigo “Vaza Jato, Glenn Greenwald e uma coincidência intrigante – parte 2,” de Paula Schmitt para o Poder360, em 13 de fevereiro de 2000, bem como foi mentor da criação de uma fundação privada com R$ 2,5 bilhões recuperados por força de acordo entre a Petrobras e Departamento de Justiça dos Estados Unidos, conforme artigo “Proposta de criar fundação com dinheiro da Lava Jato foi um erro”, do UOL, em 07 de julho de 2020.

Convido os leitores, inclusive, a ler um artigo de minha autoria para a revista Vida Destra, que você encontra aqui, sobre a PEC 05/2021, em que se discutia e se discute até hoje a modificação da Composição do MP e a elaboração de um Código de Ética para o MP.

Quanto ao ex-Presidente Jair Bolsonaro, o Sistema deve torná-lo inelegível na Ação de Investigação Judicial Eleitoral nº 0600814-85.2022.6.00.000, de 19 de agosto de 2022, ajuizada pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), em face da live exibida no Youtube com embaixadores, em 18 de agosto de 2022, em que questiona a segurança das urnas eletrônicas, acusando-o de abuso do poder político e uso indevido dos meios de comunicação social, a exemplo do ex-deputado Fernando Francischini, conforme artigo 22 da LC 64/90.

Para a surpresa geral da nação, o relator é o ministro Benedito Gonçalves que decidiu, em 14 de fevereiro de 2023, com referendo do Plenário do TSE, pela inclusão da minuta do decreto de Estado de Defesa apreendida pela Polícia Federal na casa do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres.

Uma minuta apócrifa, que inclusive o Professor Doutor Ives Gandra já assinalou que, para existência de Estado de Defesa, o Congresso tem que aprovar.

Aliás, através de notícia do Metrópoles, de 20 de maio de 2023, com o título “STF votará nomes para vagas de ministros do TSE que julgarão Bolsonaro”, vemos que os possíveis candidatos não são nada imparciais.

Diante de tantas decisões estapafúrdias, em que os casos de inelegibilidade deveriam ser analisados através de uma interpretação restritiva, os ministros da Justiça Eleitoral vão de encontro à lei e, principalmente, contra a vontade popular.

Assim, salve-se quem puder, Nikolas Ferreira, André Fernandes e Marcel Van Hatten! A sanha do TSE está desmedida ou será do Sistema?

 

 

Luiz Antônio Santa Ritta, para Vida Destra, 24/05/2023.
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Michel Krukoski
Michel Krukoski
1 ano atrás

Prisão de Deputado baseada em palavras, mesmo gozando da chamada Imunidade Perguntar, lei que retroage em prejuízo ao réu, cassação com base em Futurologia… Ninguém merece…

Parabéns por mais um excelente artigo, Luiz EXAGERADAMENTE LINDO… 🤗

Economista, advogado e bancário (aposentado)