Fábio Alves, em seu artigo “Quem, afinal, foi Gramsci?”, publicado aqui na Vida Destra, afirma que devemos conhecer o que foi e o que é disseminado pelos pensadores de esquerda, em suas palavras, “seus fundamentos teóricos” e suas estratégias.
Eu concordo em número, gênero e grau. Temos sim, pelo menos, que tentar entender o quê a esquerda quer, o quê esse povo pretende. Talvez para nós, que começamos a entender o jogo político agora, que estamos bem, mas bem mesmo, no início dessa jogada, essa seja a única forma de nos livrar mais rapidamente das armadilhas preparadas, a todo instante, por esses que não dormem, não descansam e não se importam em usar de qualquer subterfúgio ou expediente, mesmo ilícito, para conseguirem o que querem. Então, seguindo nesse intento, encontrei um artigo intitulado “A crítica social de Charles Dickens”, publicado em 2012, no Portal Vermelho. Pareceu-me um bom lugar para se começar.
É um artigo bem escrito, cita diversos autores de peso, como Zola, Flaubert, Burgess, com o intuito de construir uma boa base teórica e mostrar ao leitor como foram retratadas as condições subumanas às quais se submeteram os personagens desses grandes escritores, em seus romances, que, por sua vez, denunciavam a vida real: a degradação do ser humano ante o egoísmo desenfreado dos detentores do capital, nos primórdios da industrialização, em plena fase do Capitalismo Industrial no séc. XIX.
Eu teria citado também o fenomenal “As vinhas da ira”, do norte-americano John Steinbeck, para fechar a introdução com chave de ouro. Alguém pode questionar neste ponto (“Ué? Dar munição assim, de graça, para os esquerdistas?”), eu afirmo: não, gente, não podemos ser apenas o outro lado da mesma moeda. Devemos colocar a verdade em tudo que fizermos. E quando coisas ruins surgirem, mesmo do lado ao qual nos apegamos e defendemos, devemos expô-las. Devemos aprender com os erros e, pautados pela boa intenção sempre, corrigi-los. Portanto, coloco aqui que há também esse lado ruim do capitalismo, essa “impessoalidade impiedosa”, para o qual não devemos fechar nossos olhos. Portanto, eu concordei com parte desse artigo do Portal Vermelho.
Porém, cheguei até o fim do artigo e não vi nada sobre o capítulo “Homens e irmãos”, do livro “Tempos difíceis”, de Charles Dickens. Um capítulo tão importante quanto o restante do livro. Por que foi deixado de fora por mãos tão hábeis ao escrever sobre as mazelas do capitalismo? Infelizmente, parece que esses autores também usaram a máxima de “não dar munição ao inimigo”, mas não quero só supor isso, portanto, leiam com os seus próprios olhos o que Dickens, descrito por esse artigo como “autor de uma crítica ácida contra a voragem capitalista”, escreveu nesse capítulo, que começa assim:
“Ó meus amigos, oprimidos operários de Coketown! Ó meus amigos e compatriotas, escravos de um despotismo férreo e esmagador!”.
Essa era a fala do líder sindicalista, na reunião do sindicato com o proletariado. Mais adiante, o narrador desse romance escreve sobre
esse orador:
“De tanto berrar sob o holofote, cerrando os punhos, rangendo os dentes e gesticulando furiosamente com os braços, estava tão cansado, àquela altura, que parou e pediu um copo de água”.
Não farei comentário algum, quero que cada um reflita por si sobre o que mostrei até aqui. Continua o narrador:
“A julgar pela evidência da Natureza, ele estava acima da massa, pouco mais do que a altura do palco em que se encontrava. E, em aspectos importantes, estava fundamentalmente abaixo dela”.
Caramba! Dickens era realmente um gênio. Que são esses “aspectos importantes”? A massa que ali estava era honesta, trabalhadora, digna e sofredora, mas aquele que estava no palco esbravejando, não! Seguindo, ele continua com esse comparativo entre o proletariado e o líder sindical:
“Não era tão honesto, não era tão viril, não era tão bem-humorado; substituíra a simplicidade da massa pela astúcia, e a sensatez sólida e segura pela paixão”.
Amigos, quem gosta de literatura tem que ler esse livro. Demais! E, para complementar o meu pensamento, vou inserir esta última citação, ainda nas palavras do narrador:
“Estava tão claro, como para quem quisesse ver as vigas nuas do teto e as paredes de tijolos caiados, que cada homem ali acreditava que, de um modo ou de outro, sua vida era pior do que deveria ser; que cada um considerava responsabilidade sua unir-se a outros para melhorar essa vida; que cada um sentia que a única esperança era aliar-se aos camaradas que estavam ali à sua volta, e que aquela crença, certa ou errada (infelizmente errada, na época – observação de Dickens), aquela multidão levava solene, profunda e fielmente a sério”.
Qualquer semelhança com acontecimentos atuais teria sido mera coincidência? Ou seria a História se repetindo? É, eu sei, fan-tás-ti-co! Por que então ficar de fora de um estudo sério sobre as obras maravilhosas que descreviam, com a maestria que o leitor pôde ver aqui, as condições da nossa sociedade? Que os senhores reflitam, meus queridos amigos leitores. Reflitam! Se eu for conversar aqui sobre obras literárias, ficaremos, eu e vocês, para sempre juntos falando sobre o assunto.
Mas quero citar somente mais um livro, “O mestre e Margarida”, de Mikhail Bulgákov, que é uma sátira sobre o regime soviético de Josef Stalin, com sua censura e repressão. Por que termino com essa dica? Porque, mesmo sendo essa obra considerada literatura fantástica, ela nos apresenta a vida sofrida do homem russo no período de terror promovido por Stalin. Então, não posso deixar de fazer uma ligação com nossas vidas atualmente, com o que vemos em jornais, revistas, sites, blogs que se dizem informativos, realistas, mas que publicam, diariamente, a pura literatura fantástica.
Porém, com um agravante: essa mídia mal-intencionada não se furta a utilizar de um acontecimento real, apresentando-o retoricamente, em parte, ou fora de contexto, para construir suas narrativas que não informam, mas tentam “convencer” o leitor. Têm que ser tomadas como sátiras.
Portanto, antes de acreditar piamente em tudo que é publicado, acredite em si mesmo.