Crítica
“Não é ilegal, mas é imoral”. Foi nesses termos que Bolsonaro se referiu à viagem de Vicente Santini, o segundo na Casa Civil comandada por Onyx Lorenzini, para Nova Deli, na Índia. E, de pronto, determinou o afastamento do executivo das funções, advertindo que outras medidas poderão ser adotadas, após conversa que terácom o Chefe da Casa Civil.
Mas qual foi o erro de Santini se nenhuma ilegalidade estava envolvida no uso de um jato Legacy da FAB para ir a Davos e, de lá, para Nova Deli, onde se juntou à comitiva presidencial? Simples: ele agiu em desacordo com o regime de austeridade do atual governo. E tanto isso é verdade que todos demais Ministros viajaram em vôos comerciais, classe econômica.
A atitude de Santini fez lembrar o procedimento corriqueiro de autoridades de governos anteriores que usavam e abusavam da possibilidade de se valerem de vôos em aeronaves da FAB, tanto para viagens oficiais quanto, muitas vezes, para viagens particulares. O que, aliás, ainda é comum por parte de pelo menos um Ministro do STF. De fato, as normas abrem essa possibilidade que está revestida de toda aparência dos odiosos privilégios que funcionários dos primeiros escalões dos poderes se julgam merecedores, como se pertencessem a uma casta de privilegiados, favorecidos por benesses distantes da realidade que qualquer outro brasileiro. Para nós, cidadãos comuns, trabalhadores e cumpridores de nossos deveres, tal conduta sempre pareceu uma extravagância descabida, uma espécie de bofetada em nossas faces.
Não pensem que os vôos nessas aeronaves são desconfortáveis, como seria de se supor num equipamento militar. Pelo contrário. O modelo Legacy da Embraer é uma aeronave incrivelmente sofisticada e luxuosa, capaz de transportar de 7 a 15 pessoas, dependendo da versão. Neste caso específico, transportou apenas três passageiros: a secretária do Programa de Parcerias de Investimentos, Martha Seiller e a assessora internacional do PPI, a diplomata Berta Gadelha, além de Santini, vôo que custou a bagatela de R$ 740 mil. Não foi ilegal, mas contrastou absurdamente com a conduta de Bolsonaro e de seus Ministros que primam pelo comportamento comedido, modesto mesmo, em todas as ocasiões, seja aqui ou em viagens internacionais.
Bolsonaro é do tipo que – aqui ou no exterior – faz suas refeições não oficiais em restaurantes simples, muitas vezes em bufetes por quilo ou mesmo bandejões. Ele tem hábitos frugais, raramente bebendo alcoólicos, restringindo suas libações a uma meia taça de vinho branco, mas preferencialmente apenas refrigerantes ou água. Jamais se hospeda em hotéis de luxo e, quase sempre, em apartamentos convencionais. Claro, ele voa no avião presidencial por questões de segurança, invariavelmente com uma equipe reduzida. Nessa viagem à Índia, levou junto sua filha Laurinha e a enteada Letícia. Quem se atreveria condená-lo por isso quando outro presidente viajava acompanhado da amante, fazendo da aeronave presidencial uma espécie de motel particular?
Portanto, a viagem de Santini causou indignação e irritação ao Presidente. E ainda que o ato não tenha se revestido de qualquer ilegitimidade, Bolsonaro a considerou imoral e, além do afastamento do executivo, determinou que a regras que regem o uso de aeronaves da FAB sejam revistas a fim de evitar-se “abusos”, como ele qualificou este caso.
Será que não teria sido suficiente uma reprimenda, uma admoestação? Bolsonaro foi injusto em sua decisão? A meu ver, não. Faltou a Vicente Santini o bom senso de perceber que os tempos mudaram que o Brasil também está mudando. E se existe algo que desqualifica alguém para cargos na Casa Civil da Presidência é a falta de bom senso.
Ponto para o Presidente e que sirva de exemplo para todos demais.
Laerte A Ferraz para Vida Destra 28/01/2020
Na foto: Aeronave Legacy
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Texto claro, pertinente e lúcido!
Uma vez mais nosso Pres dando o bon exemplo, sem regalias! A contenção de gastos não deve ficar só na teoria!
Grato, Simone.
Punição, isso mesmo. Vista grossa não educa.