Uma crônica política de ficção, puro humor sem qualquer compromisso com a realidade.
A ausência de escândalos de corrupção no Governo Federal deve estar causando surtos de perplexidade nos opositores e esquerdistas.
Fico imaginando os diálogos nas reuniões desses, sempre em discretos restaurantes ou residências oficiais, envolvendo as mais destacadas figuras oposicionistas, tudo regado dos melhores vinhos, uísques e acepipes, nas quais destilam suas frustrações, pois sabem que a população elegeu alguém que não se corrompeu na política:
“Como assim? Esse pessoal do Bolsonaro não cede às oportunidades, às tentações? Será que não são humanos?” – diz um deles após degustar um bocado de caviar de esturjão.
“É claro que são humanos. – responde outro – “São como nós, é só uma questão de tempo e vamos ter o que denunciar”.
“Será? – retruca o primeiro – “Já se passaram 20 meses e nada; nenhuma denúncia, nenhum desvio de verba, nenhum superfaturamento… Nada. Já tentamos de tudo, usamos todo decálogo de Lênin e nada cola nele. Tem coisa aí que escapa à minha compreensão. O que será que eles estão armando?”
“Calma, amigos” – diz um terceiro – “Tem o caso Queiroz. Ele está preso, ilegalmente é verdade, mas a pressão deve estar sendo grande sobre ele, vai acabar fazendo alguma delação”.
“Queiroz?” – indaga outro – “Ora, companheiros, essa história de rachadinha não dá nada. Todo mundo sempre fez e nada jamais aconteceu. Além disso, nada se comprovou contra o filho do homem e isso não o atinge diretamente. É preciso coisa melhor, algo contra ele.”
“Melhor? – retruca o terceiro –” E o caso dos R$ 86 mil? Isso tem potencial, não tem?”.
“Não tem não, amigo” – afirma o primeiro – “Esse valor, dividido no tempo, dá pouco mais de milão por mês. Além disso, é coisa antiga. É muito pouco para virar um escândalo de corrupção. Isso é troco que eu dava aos meus auxiliares por mala transportada, além dos cargos; é brincadeira de criança. Vamos falar sério”.
Um ar de desânimo se abate sobre o grupo.
“O que podemos fazer? Não podemos ficar parados, esperando que o mesmo espírito dos governadores aliados se manifeste neles. Se não fizermos nada, o cara se reelege e, aí, acabou para nós. Vamos lá, é preciso usar a imaginação, a criatividade, fazer alguma coisa…”
“Calma” – volta a pedir o terceiro – “Temos a imprensa ao nosso lado, o Supremo está conosco e o os presidentes das casas também, além dos governadores do Norte e Nordeste. Temos esses recursos, vamos tratar de mudar as regras de indicação de Ministros do STF, de reeleição de Presidente… A segunda turma vai inocentar o Lula. Se fizeram isso com o Genô e o Delú, acham que não farão com o maioral? Olhem, há 90% de chance de ele sair limpinho dessa e o povo esquece rápido. Tirando o Bozo, ele se elege mais uma vez e aí será a glória. Além disso, a chapa Bozo e Mourão ainda vai ser julgada. Nem tudo está perdido e não é hora para desespero. Vamos trabalhar com as regras, só é preciso mudá-las. Vocês não acham?” – diz se dirigindo ao outro membro do grupo, ainda quieto.
Então, o quinto integrante da quadrilha, um alto chefão, considerado uma coluna política, se manifesta:
“No meu tempo, era só liberar uma grana para garantir aprovação de leis de nosso interesse. Mas tínhamos válvulas de escape para isso: verbas de ministérios, controle das estatais, muitos cargos para nomeações, uso da máquina pública, muita verba de publicidade… Hoje isso está acabando. Quem sobrou da primeira fase do desaparelhamento, está se borrando de medo da segunda fase… Não está fácil. Só mesmo a imprensa e os supremos, além dos aliados de sempre no Congresso. Só que estamos sem moeda de troca, só podemos prometer o que será quando retornarmos. Nem mais um bom marqueteiro temos.”
“Mas deixem comigo.” – continua essa quinta coluna, após um leve gole de Châteu Lafite Rothschilg Gran Cru. – “Vou fazer umas declarações públicas para ir alimentando a imprensa e amaciando a população. Enquanto isso, vocês que têm mandato e lideranças nos partidos, trabalhem os companheiros e usem os partidos que são nossos “puxadinhos” para continuar fazendo barulho. Usem os traíras, prometam apoio. Vamos levantar junto ao afilhado uma boa verba com os chineses para financiar nosso projeto. Um Estado vai ser praticamente vendido para eles e vai sobrar muitos recursos nessa operação. O importante é manter a coisa viva e não desistir, não esmorecer.”
“Um brinde a isso” – diz exaltado o primeiro, levantando seu cálice com vodca Stolichnaya – “Unidos, jamais seremos vencidos”. E completa caprichando na pronúncia em russo: “Za Zdorovye”. “ Gan Bei” – responde o quinto em mandarim.
Laerte A Ferraz para Vida Destra, 08/09/2020
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Interessante essa ficção…eu juro que queria ser uma mosquinha para ouvir a conversa dos barões do bastião do poder.
Mas sabendo do caráter deles, a gente pode imaginar, não é?
Neste hilário artigo de Laerte em que indaga “cadê a corrupção” fica difícil para Oposição descobrir um escândalo, se as reuniões de Bolsonaro são regadas a um suco de groselha com água com gás. Talvez o esquema esteja no caldo de cana com pastel. Só posso afirmar que eles não se lambuzam.
Não se lambuzam mesmo. Aliás, nem um pouco.
Muito bom Laerte! Parabéns!
Não sei por que, mas esta história me pareceu familiar! kkkk
É familiar sim, caro amigo. Bem familiar aliás.