Falar do funcionalismo público no Brasil é algo delicado, e, ao mesmo tempo, polêmico. Quando este assunto é discutido, geralmente a imagem que se tem do funcionário público é a de um sujeito preguiçoso, desleixado, que não faz nada, que é um incompetente que fica o tempo todo de braços cruzados (pois sabe que o salário é garantido no final do mês), e que possui mil e uma mordomias. E isso já se tornou um conceito padrão para algumas pessoas.
De fato, há casos de funcionários públicos que agem exatamente assim. Na cidade onde eu moro, houve uma queixa de algumas pessoas contra o hospital municipal: filas enormes para marcar consulta, médicos que saíam cedo para não querer atender mais ninguém, enfermeiros que ficavam conversando o tempo todo, enfim, uma falta de dedicação, um descaso generalizado. Por essas e outras é que o funcionalismo público é, em certas horas, mal visto.
Por outro lado, há funcionários públicos que procuram dar o melhor de si, que são atenciosos, que se preocupam em atender ao povo da melhor forma possível, que realmente se dedicam ao trabalho, enfim, que honram a profissão. Estes são a prova de que o funcionalismo público é bom e pode ser ainda melhor quando todos se empenham ao máximo nas suas tarefas.
Ao se falar do funcionalismo público, é necessário que haja imparcialidade e, ao mesmo tempo, um certo senso de justiça. O certo é elogiar os bons, e criticar os maus. Tal crítica, porém, deve ser feita no sentido de exigir uma mudança de postura (e não para humilhar, como muitos pensam).
Há pessoas e pessoas. Há funcionários públicos e funcionários públicos. Não é porque um ou outro é improdutivo que todos, necessariamente, serão. Se um ou outro auditor da Receita Federal for corrupto, então toda a Receita Federal deve ser considerada corrupta? É óbvio que não, pois tal generalização seria injusta não só em relação aos bons auditores como também em relação ao conceito da instituição perante a opinião pública.
O problema é que a má imagem do funcionalismo público (como foi mostrada no início deste artigo) quase sempre costuma ser generalizada pela grande imprensa. E essa generalização costuma ser divulgada com mais força quando se trata de funcionários de empresas estatais. Aí é que a crítica se torna mais pesada.
Em 2014, o jornalista Luis Nassif publicou, num blog, um artigo intitulado “Eu desisti do Brasil”. Neste mesmo artigo (visto aqui ), tem uma parte onde ele disse textualmente assim:
“Por que será que o brasileiro é contra a privatização das estatais? Fácil: em empresa privada, é preciso trabalhar, ser eficiente e produtivo; senão, perde o emprego. Nas estatais, é eficiência zero, comprometimento zero, e todos a receber o salário garantido, pago com o imposto dos mesmos idiotas contribuintes”.
É evidente que tal generalização não foi bem vista (e nem tampouco bem aceita) no meio do funcionalismo público. Um bancário (cujo pseudônimo é “Bancário revoltado”) viu esta reportagem, e resolveu dar uma resposta à altura. Vejam, abaixo, o teor dessa mesma resposta:
RESPOSTA A LUÍS NASSIF
(*) – Bancário revoltado
Acessando a Internet, vi uma opinião do Sr. Luís Nassif. E ele disse textualmente isto:
“POR QUE SERÁ QUE O BRASILEIRO É CONTRA A PRIVATIZAÇÃO DAS ESTATAIS? FÁCIL: EM EMPRESA PRIVADA, É PRECISO TRABALHAR, SER EFICIENTE E PRODUTIVO; SENÃO, PERDE O EMPREGO. NAS ESTATAIS, É EFICIÊNCIA ZERO, COMPROMETIMENTO ZERO, E TODOS A RECEBER O SALÁRIO GARANTIDO, PAGO COM O IMPOSTO DOS MESMOS IDIOTAS CONTRIBUINTES!”
Na qualidade de funcionário público, venho, publicamente, contestar certas insinuações descabidas, levianas, e infundadas do Sr. Luís Nassif em relação às estatais (e também em relação aos seus funcionários):
Sr. Luís Nassif,
Sou funcionário de uma estatal (no caso, um banco federal muito conhecido). Como todo funcionário ciente das suas responsabilidades, sei como devo proceder no meu local de trabalho. Em todos estes anos de profissão, posso garantir e afirmar, com plena, total, convicta, e absoluta certeza de que jamais fui omisso. Em outras palavras: nunca me acomodei, e também nunca tive nenhuma repreensão (bem como nunca fiz nada que desabonasse minha conduta moral ou profissional). Muito pelo contrário: sempre cumpri (e continuo a cumprir) fielmente as minhas obrigações. Tanto que já tenho mais de 20 anos de bons serviços prestados ao banco (inclusive com elogios da chefia).
Para ser admitido nesta mesma estatal, tive que ser aprovado em um rigoroso concurso público (que é uma espécie de “vestibular”). Caso o senhor não esteja lembrado, a Constituição Federal, no Título III, Capítulo VII, Seção I, Artigo 37, Inciso II, diz claramente que “a investidura em cargo ou emprego público depende de prévia aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração”. Sendo assim, não é qualquer um que pode trabalhar numa estatal: é preciso ser aprovado em concurso público. Será que o senhor, alguma vez, já prestou concurso público para ser jornalista? Ou o senhor é apadrinhado de algum político?
O senhor é conhecido na mídia em geral como comentarista econômico, mas, pelas suas colocações aqui, vejo que o senhor está mal informado. Como especialista desta área, o senhor certamente sabe muito bem (e até bem melhor do que eu) que toda e qualquer empresa (seja pública ou privada) precisa ser eficiente sempre, sob pena de ser ultrapassada pela concorrência (ou até mesmo de ser excluída do mercado). No banco onde eu trabalho (que, por sinal, é uma estatal), não é diferente: somos obrigados a cumprir determinadas metas de produtividade que são estabelecidas. Os que não conseguem atingir essas mesmas metas perdem certas promoções, e, a depender, podem ser transferidos para outras agências, e passam a exercer cargos menos importantes (e, conseqüentemente, a ganhar menos). Logo, cai por terra o seu argumento de que as estatais são produtividade zero (assim como também está totalmente distorcida e equivocada a sua visão de que o comprometimento do funcionalismo no serviço público em geral é zero).
Sr. Nassif, não vim de família rica (nem faço parte da chamada “elite” onde o senhor certamente está inserido). Nasci num lar de origem humilde: meu pai é um simples pedreiro negro e pobre (hoje está aposentado, depois de ter vivido uma vida inteira de muito sacrifício), e minha falecida mãe (que Deus a tenha) era uma costureira. Fiquei órfão de mãe muito cedo (aos 8 anos de idade), e, em virtude disso, tive que trabalhar vendendo frutas e verduras numa feira livre para ajudar a sustentar minha família (meu pai viúvo e meus 2 irmãos menores). Devido à extrema pobreza de minha família, não pude me dar ao luxo de estudar em colégio particular (o senhor, certamente, deve ter sido um dos poucos que tiveram este mesmo privilégio). Muito pelo contrário: tive que estudar em escola pública durante quase toda minha vida. Enfim, passei muitas dificuldades como todo e qualquer pobre. Mas, com muita luta (e, principalmente, muita fé em Deus), consegui vencer na vida: tive a felicidade de ser aprovado num concurso público para ser admitido no emprego onde estou até hoje. É deste mesmo emprego que eu obtenho o meu próprio sustento (e também o de minha família). Faço como disse o apóstolo Paulo: “Tendo, porém, sustento e com que nos cobrirmos, estejamos com isso contentes” (1 Timóteo 6:8). Nunca fiz do meu emprego uma ostentação (e nem me acho melhor do que outras pessoas só porque trabalho numa estatal).
Se existe eficiência zero em algumas estatais (como o senhor supostamente alega), é por falta de uma fiscalização que atue com rigor contra as que se encontram em tal situação. Não é porque uma ou outra estatal é ineficiente que todas serão necessariamente iguais (toda regra tem suas exceções). Entre “uma ou outra” e “todas” existe uma diferença muito grande, o senhor não acha? Portanto, Sr. Nassif, procure se informar melhor sobre o desempenho de certas estatais ou sobre a atuação do funcionalismo dentro delas (antes de fazer acusações sem provas ou julgamentos precipitados).
O senhor, no tom de sua crítica, fala mal das estatais. Mas eu já soube que o senhor já teve (ou tem) uma empresa denominada “Dinheiro Vivo Agência”, a qual já enfrentou (ou um ainda está enfrentando) sérios problemas com a justiça (como diz estas reportagens aqui, aqui e aqui ).
E então, Sr. Nassif? O senhor fala tanto em eficiência, produtividade, comprometimento. E por que, apesar disso, o senhor nunca mostrou estas denúncias ao público? De que (ou de quem) o senhor tem medo? O que o senhor está escondendo (ou a quem o senhor está protegendo)?
Só pode julgar ou criticar alguém quem tem um passado limpo, quem nunca respondeu a nenhum processo, quem nunca foi denunciado, quem nunca se envolveu em nada suspeito (ou irregular), quem nunca foi intimado para prestar depoimento, enfim, quem nunca teve (e não tem) nenhum problema perante a justiça. Será que o senhor possui estas qualidades? Será que o senhor tem idoneidade (ou autoridade moral) o suficiente para julgar ou criticar alguém? Dizem que “quem não deve, não teme”. O que o senhor vai alegar ao público diante das denúncias aqui apresentadas contra a sua pessoa?
Faço questão de que esta minha mensagem seja amplamente divulgada em todos os meios de comunicação para que o senhor tome conhecimento, e, ao mesmo tempo, espero uma retratação em público da sua parte!
(*) – Pseudônimo de um funcionário público cumpridor dos seus deveres
Se o jornalista Luís Nassif não tivesse generalizado a sua crítica em relação aos funcionários públicos das estatais, talvez ele não tivesse recebido esta resposta. Mas quem fala o que quer, ouve o que não quer…
Claro que o funcionalismo público do Brasil está longe de ser 100% perfeito. Como foi dito no início, há pessoas e pessoas. Há funcionários públicos e funcionários públicos. Não se pode, como se diz no popular, “por um, tirar todos”. É preciso saber separar o joio do trigo (para que não sejam cometidas injustiças). Enfim, o que se espera do funcionalismo público é que todos se conscientizem de que estão empregados para servir ao povo (e não aos seus próprios interesses pessoais).
Que esta mensagem sirva para que todo o funcionalismo público esteja ciente de que tem um dever a cumprir: o de ser responsável pelo futuro do Brasil!
“Quem não vive para servir, não serve para viver” (adágio popular)
Justiceiro Solitário, para Vida Destra, 16/08/2020.
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Parabéns! É necessário separar os bons e maus profissionais