A intrigante decisão da Ministra Carmen Lúcia, na continuidade das surpresas jurídicas com as quais o STF tem brindado a Nação merece uma análise profunda.

Quando a vi, de primeiro olhar, achei estranho, porque pareceu-me que ela decidira de ofício, isto é, sem provocação de algum interessado. Mas estava enganado. Ela decidiu sobre um “Habeas Corpus”, nº 156.583 do STF, cuja imagem aqui está, extraída do site do próprio Supremo. As informações importantes aqui são muitas.

Primeiro os pacientes, isto é, os beneficiados pelo HC, quais sejam, “TODOS AQUELES PRESOS EM RAZÃO DA APLICAÇÃO DA SÚMULA 122 DO EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA QUARTA REGIÃO”. Dentre esses, figura o ex-presidiário Lula, como todos sabem.

Segundo, o autor desse HC, o advogado Sidney Duran Gonçalez, com escritório no município de Presidente Epitácio, SP. Referido tribuno tem atuado, reiteradamente, em favor do ex-presidiário, já tendo ajuizado mais de uma ação ou HC em favor de Lula. Não encontrei notícias que esclareçam a que título o faz, se milita em favor de Lula sob contrato ou se o faz espontaneamente, de forma gratuita.

Pois nesse HC, ele obteve sucesso. Trata-se de um cidadão notável.

Terceiro, uma “Súmula” é uma consolidação, uma reunião, de diversas decisões de um Tribunal, que serve de orientação às decisões do próprio Tribunal e das instâncias sob ele. O texto da agora famosa Súmula 122 é o seguinte:

SÚMULA 122 do TRF-4
Encerrada a jurisdição criminal de segundo grau, deve ter início a execução da pena imposta ao réu, independentemente da eventual interposição de recurso especial ou extraordinário.
D.E. (Judicial) de 14-12-2016″

Ou seja, o entendimento do TRF-4 era de que a prisão deveria ser aplicada logo após esgotado o 2º Grau de Jurisdição, que é o próprio Tribunal Federal. Aliás, todos lembram que esse foi o fundamento legal que permitiu a prisão de Lula.
Sobre o HC do advogado do interior aqui de São Paulo, a decisão de Carmen Lúcia foi exatamente a seguinte:

“Concedida em parte a ordem
(…) apenas para determinar ao Tribunal Regional Federal da Quarta Região analise, imediatamente, todas as prisões decretadas por esse Tribunal com base na sua Súmula n. 122 e a coerência delas com o novo entendimento deste Supremo Tribunal, colocando-se em liberdade réu cuja prisão tiver sido decretada pela aplicação da jurisprudência, então prevalecente e agora superada, no sentido da possibilidade de início de execução provisória da pena e se por outro motivo não estiver preso, ou deverá deixar de ser expedido ou recolhido o mandado de prisão, se ainda não tiver sido cumprido (…)”.

Ou seja, Carmen Lúcia mandou examinar TODOS os casos cujos presos estejam cumprindo pena por força, exclusivamente, de decisão do TRF-4, pelo esgotamento dos recursos até o 2º grau. Essa decisão excepciona somente casos de prisão em flagrante delito, prisão preventiva, prisão temporária ou os que já tenham sido condenados pelo STF. Vejam que NÃO há na decisão da Ministra qualquer exceção que impeça a soltura de presos por crimes hediondos, violentos, contra a vida ou contra patrimônio alheio. O número de presos que pode ser libertado, neste momento, é incalculável. Portanto, o Habeas Corpus beneficia TODOS os presos por decisões do TRF-4, esgotado o segundo grau de jurisdição.

Mas é certo que afeta os Estados de Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, que verão as portas de seus presídios se abrirem.

Pois bem.

O que é estarrecedor, e discuti com muitos a respeito do tema, desde leigos até outros profissionais do meio jurídico: as consequências de tão espetacular decisão!

Primeiro, a evidente soltura de um número ainda incalculável de criminosos, além dos 38 corruptos presos pela Operação Lava-Jato, por decisão do TRF-4 com base na referida Súmula 122.

Segundo, a evidente ameaça à Segurança Pública que esses presos podem representar.
Terceiro, a mensagem implícita, na somatória entre esta decisão e aquela que estabeleceu que as prisões só podem ser efetuadas depois do trânsito em julgado:
APENAS E SOMENTE O STF PODE MANDAR PRENDER PELO ESGOTAMENTO DE RECURSOS.

Vejam que há uma infinidade deles. Daí:

  • Isso impedirá, ou no mínimo adiará, as prisões de milhares de criminosos, quiçá até que aconteça a prescrições de seus crimes, ficando livres, leves e soltos nas ruas. Beneficiará, por certo, aqueles presos que têm advogados caríssimos, do estilo de um que passeia de bermudas pelo STF e que podem ajuizar recursos atrás de recursos.
  • Aqueles presos que serão libertados, bem como aqueles que estão nas ruas, entenderão isso como “só o STF prende“. Portanto, o negócio é não ser pego em flagrante, nem deixar que determinem suas prisões de forma preventiva ou temporária. Novamente, nesses dois últimos casos, aqueles que têm advogados caros devem conseguir manter-se em liberdade. Alguém já reparou que os membros de facções criminosas costumam ter advogados caros, bastante eficientes e dedicados?
  • 82,57% da população carcerária que preservou seus direitos políticos votou no PT, nestas últimas eleições. De uma vez, irá para as ruas uma considerável massa de sectários de Lula. Isso me fez lembrar dos acontecimentos em Fortaleza, CE, ou seja, das ações do crime organizado naquela capital. Será que foi um laboratório?

Há uma série de estranhas “coincidências” nessas ações do STF, beneficiando corruptos, libertando antes Lula e agora um grande contingente de criminosos. Eu sempre me pergunto “cui bono”: a quem beneficia a formação de um “exército de condenados” nas ruas? Essa decisão do STF tem caráter eminentemente jurídico, ou é política e ideológica?

Por certo que não é o cidadão de bem o beneficiado com isso!

Não há paralelo em nenhum lugar do mundo que um sistema jurídico preveja a necessidade de julgamento por quatro decisões antes de determinar a prisão de um criminoso!

Até o presente momento, todas essas aberrações jurídicas que o STF tem produzido, desde instauração de inquéritos para os quais ele não tem competência, bloqueio de investigações sobre os integrantes do próprio Tribunal, desmonte da Operação Lava-Jato com base em uma filigrana jurídica bizantina e bizarra, etc., bem como essas últimas decisões sobre prisões somente após esgotamento de todos os recursos e libertação em massa de presos, são reversíveis.

Muita coisa pode acontecer, desde o impeachment de algum dos Ministros, até a aposentadoria de outros deles. Mudando apenas um dos ministros, o placar já mudaria, de 6×5 contra prisão em 2ª instância para 6×5 a favor dela. O problema disso é o prazo. Porque até reverterem essa situação, a população inteira do Brasil vai conviver com mais criminosos, e mais ousados, dado que vão perceber a “carta-branca” que ganharam para cometimento de seus delitos.

Entretanto, a partir do momento em que acontecer a primeira morte decorrente do crime, a partir de agora, a situação se torna irreversível, a não ser que alguém consiga, divinamente, ressuscitar essa pobre vítima. Esse sangue futuro não estará nas mãos dos cidadãos de bem, mas naquelas que estamos observando, apreensivos agora, que estão torcendo e retorcendo o ordenamento jurídico deste país.

Fábio Talhari, para Vida Destra, 23 de novembro de 2019.

Fábio Talhari
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Luciene Manske
Luciene Manske
4 anos atrás

Será que armando a população de bem deste país, já não daria uma freada no caos que irá se instalar. Não está na hora do olho por olho, dente por dente?

Ana Silva
Reply to  Luciene Manske
4 anos atrás

Sem chance de retrocesso. A população tem direito sim de se defender, de ter posse de arma e porte. Mas, quem mata bandido são as autoridades competentes. Enfim, tenho certeza que o governo e as forças de segurança nacional estão atentos.

Maria Edineth jardim
Maria Edineth jardim
4 anos atrás

Acho que o presidente e forças armadas estão dando corda demais a todos os criminosos e a o STF , meu medo é que terminamos nós enforcando com tanta corda que estão dando

Frany
Frany
4 anos atrás

Seu esclarecimento é perfeito, Fábio! Tempos muito inseguros por causa da camarilha do stf já abrindo caminho para instalar aqui o caos como acontece no Chile! Que Deus tenha Misericordia de nós??!

Cristina casañas
Cristina casañas
4 anos atrás

COMO, chamar de GRAVE os atos destes sórdidos ministros que CONTRATAMOS através de nossos prepostos???

Ora, que tipo de COISAS somos nós??

PAGAMOS ABSURDAS quantias para que nossos funcionários públicos temporários ESCREVAM LEIS. Escrevem leis que nos subjugam, que os beneficia e AINDA assistimos a esse espetáculo triste COMPLACENTES??? Qual será a loucura que nos sustenta???

Temos que unir advogados, peticionar esses funcionários, unir o povo e EXIGIR respeito ao empregador desses ministros do STF !!!

Ou, calar e deixar que destruam nossas vidas! ??

Elizabeth
Elizabeth
4 anos atrás

Excelente texto Fábio! Extremamente lúcido…

TEREZINHA CANTANHEDE
TEREZINHA CANTANHEDE
4 anos atrás

Deus nos acuda!

Luis Afonso Pinheiro Valido da Conceição
Luis Afonso Pinheiro Valido da Conceição
4 anos atrás

Já estamos cientes a muito, esses ministros não valem nada. Pior, tem um valor em muito negativo, perde-se por conta deles muitas vidas ao mês. Logo o que é justo para estes?

Sidney
Sidney
3 anos atrás

ótima matéria…obrigado