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UMA VERGONHA PÚBLICA

Acho que todos lembram que no início de fevereiro, alguns “nobres parlamentares” tomaram a estupenda iniciativa de ajuizar, perante o STF, pedido de impeachment do Ministro Abraham Weintraub.

Na época, questionei profundamente tal pedido, desde sua forma, até se os autores o poderiam fazer, e adentrei ao mérito da questão. Isso gerou uma polêmica gigantesca nas redes sociais, com muita gente apoiando o Ministro e, do outro lado, alguns apoiando a malfadada e natimorta iniciativa.

Pois bem.

Vejam que o pedido, inicialmente, foi apresentado por 5 parlamentares, que eu destaquei em um post no Twitter:

  1. Alessandro Vieira, Senador pelo PPS (Cidadania) pelo Estado de Sergipe, é Delegado de Polícia Civil. Sobre ele pesa denúncia, veiculada em fins de janeiro deste ano. Na condição de presidente do diretório estadual do Cidadania em Sergipe, o senador Alessandro Vieira teria contratado a empresa Certa Consultoria e Pesquisas para execução de pesquisa de opinião para o cargo de prefeito de Aracaju, referente às eleições 2020. Com essa pesquisa, destinou recursos públicos a “amigos” do Cidadania, e ainda aproveitou para “testar” o próprio nome junto ao eleitorado de Aracaju, analisando a viabilidade de uma futura candidatura sua para o cargo de governador do Estado de Sergipe. Hoje, divide um gabinete em Brasília, com outros signatários da petição de impeachment, a saber, Tábata Amaral (PDT-SP) e Felipe Rigoni (PSB-ES), estes dois conhecidos por terem sido financiados, em suas carreiras acadêmicas e quiçá políticas, pelo megaempresário do setor de Educação, Jorge Paulo Lemann.
  2. Fabiano Contarato também é Delegado de Polícia Civil, além de professor de Direito. Senador pela Rede Sustentabilidade pelo Estado do Espírito Santo. Foi filiado anteriormente ao Partido da República. Como os demais signatários originais da petição do impeachment, está em seu primeiro mandato. Ativista por Direitos Humanos, é casado com o fisioterapeuta Rodrigo Gaberio e eles têm um filho. É um parlamentar ficha-limpa, ressalte-se, como os outros quatro.
  3. Felipe Rigoni, deputado eleito pelo Estado do Espírito Santo, seu partido é o PSB. É Engenheiro de Produção, formado pela UFOP (Universidade Federal de Ouro Preto-MG), como o 1º da turma, ou seja, é um intelectual de primeira linha. É deficiente visual, ficou cego aos 15 anos, após 17 cirurgias para tentar reverter uma inflamação nos olhos, o que lamento muitíssimo. Fez mestrado em Oxford, com bolsas das Fundações Lemann e Estudar, ambas mantidas por Jorge Paulo Lemann, diga-se en passant.
  4. João Henrique Campos, deputado eleito pelo Estado de Pernambuco, é do PSB. Moço, bastante jovem (tem 26 anos), é Engenheiro Civil pela UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), é bisneto de Miguel Arraes e filho de Eduardo Campos, que morreu de forma trágica, em 13 de agosto de 2014, quando o jato em que viajava do Rio de Janeiro a Guarujá caiu em um bairro residencial de Santos, pelo que apresento meus sinceros pêsames. Foi um episódio que chocou o país.
  5. Tábata Amaral, deputada eleita pelo Estado de São Paulo, é do PDT. É cientista política, formada pela Universidade de Harvard, onde também cursou Astrofísica. Também bastante jovem, (26 anos), é ativista pela educação e é outra intelectual de primeira ordem, tendo sido medalhista de prata na OBMEP (Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas e Privadas) em 2005, e ouro em 2006. Também está ligada a Jorge Paulo Lemann. Envolveu-se em uma polêmica, porque teria contratado, com o fundo eleitoral público do PDT, os serviços de seu namorado e ex-colega de curso em Harvard, o colombiano Daniel Alejandro Martínez, para elaborar uma análise estratégica de sua campanha a deputada federal. A então candidata pagou R$ 23 mil pela prestação dos serviços, que foram feitos entre agosto e outubro de 2018. Contudo, consideraram não haver irregularidade, segundo a legislação eleitoral, na contratação de parentes ou cônjuge com verbas eleitorais, por força de súmula vinculante expedida pelo STF, que veda nomear parentes para cargos comissionados. Recentemente, envolveu-se em outra polêmica, por conta de uma proposta de fornecimento de absorventes femininos em locais públicos, o que custaria cerca de R$ 5 bilhões aos cofres públicos.

O que há de comum entre os parlamentares acima é que todos são de esquerda, e todos de primeiro mandato.

Na época do ajuizamento da ação, até ponderei que deputados e senadores da “velha guarda” não se meteriam nessa “aventura” jurídica. Mas, após a petição ser protocolizada no STF, os seguintes deputados também aderiram a ela:

  1. Alexandre Frota de Andrade, PSD-SP;
  2. Aliel Machado Bark, PSB-PR;
  3. Danilo Jorge de Barros Cabral, PSB-PE;
  4. Fabiano Galletti Tolentino, PPS-MG;
  5. Israel Matos Batista, PV-DF;
  6. Joenia Batista de Carvalho (Joenia Wapichana), Rede-RR;
  7. Marcelo Calero Faria Garcia, PPS-RJ;
  8. Maria do Rosário, PT-RS;
  9. Maria Margarida Martins Salomão, PT-MG;
  10. Maria Perpétua de Almeida, PCdoB-AC;
  11. Rafael Huete da Motta, PSB-RN;
  12. Raul Jean Louis Henry Júnior, MDB-PE;
  13. Reginaldo Lázaro de Oliveira Lopes, PT-MG;
  14. Rodrigo Antônio de Agostinho Mendonça, PSB-SP.

Muitos dessa lista de ingressantes a posteriori são amplamente conhecidos na mídia, e os partidos são sempre os mesmos: Rede, Cidadania, PT, PCdoB, PSB. Siglas que devem ficar marcadas nas memórias dos eleitores, diga-se desde já. Foram 17 deputados e 2 senadores que entraram nessa barca furada.

O pedido de impeachment versava sobre as seguintes razões:

  1. Prática dos crimes de responsabilidade previstos nos arts. 4º, 7º e 9º, combinados com o art. 13, I, todos da Lei 1.079/1950, porque o Ministro não apresentara um programa nacional de definição de soluções didáticas e pedagógicas para alfabetização;
  2. Possível infração dos deveres da transparência e da impessoalidade e, ainda, uma pretensa omissão desidiosa do requerido ao deixar de observar as normas e os princípios normativos previstos na Constituição Federal de 1988, por omissão do Ministério comandado pelo denunciado para fazer uso integral de R$ 1 bilhão resgatados pela Lava Jato;
  3. Condutas incompatíveis com a dignidade e decoro do cargo, por conta de discussões nas redes sociais.

Também em princípio de fevereiro deste ano, aduzi esses motivos no Twitter e no Whatsapp, e debati com muitos amigos e leitores desta Revista, concluindo que nenhum deles caracterizaria crime de responsabilidade que ensejasse um impeachment. Ou seja, no mérito, essa ação estaria fadada ao fracasso.

Mas nem precisou chegar a tanto.

Ocorre que a jurisprudência e a doutrina jurídica distinguem as situações de responsabilização dos Ministros de Estado por infrações político administrativas em:

  1. Conexas com crimes da mesma natureza praticados pelo Presidente da República, hipótese em que os crimes de responsabilidade dos Ministros de Estados devem ser julgados pelo Senado Federal, conforme artigo 52 da Constituição Federal de 1988;
  2. Outras em que há imputação de crime de responsabilidade restrita aos Ministros de Estado,sem conexão com crimes do Presidente, hipótese que seria julgada pelo STF, conforme artigo 102 da Constituição.

O caso do malfadado pedido de impeachment proposto pelos 17 deputados e 2 senadores ficaria a cargo do STF, na hipótese “2”, que então o recebeu.

Entretanto, para explicar aos leigos em Direito, existem três condições para uma ação judicial. Sem essas condições a ação não existe:

  1. Possibilidade jurídica do pedido: é preciso que haja, no ordenamento constitucional, legal ou normativo, alguma regra que preveja expressamente o direito a ser defendido, ou seja, é preciso haver lei;
  2. Interesse de agir, ou seja, que tenha ocorrido alguma lesão, algum ferimento, a algum direito previsto na lei ou constituição, ou seja, é preciso haver uma lesão;
  3. Legitimidade para a ação, que se divide em:
    a. Ativa: é quem sofreu a lesão em seu direito, ou quem possa representá-lo, é o autor da ação. No caso que estamos analisando, os autores da ação não são parte legítima ativa, como adiante explico, e por isso, a ação foi arquivada;
    b. Passiva: quem causou a lesão no direito do anterior, ou quem é responsabilizado pela lei por isso, é o réu na ação

Porém, no caso de crimes de responsabilidade autônomos contra Ministros do Estado, a jurisprudência e doutrina não têm dúvida de que o processo se trata de ação penal pública, incondicionada, cuja titularidade é do Ministério Público. Ou seja, quem poderia ajuizar esse pedido de impeachment contra Abraham Weintraub seria somente, e tão somente, a Procuradoria Geral da República, que é a chamada parte legítima ativa.

Essas condições da ação são temas da matéria Teoria Geral do Processo, que é ensinada no 2º ano do curso de Direito. O básico.

Por essa razão, entendeu o Ministro Lewandowski que não é possível estender aos cidadãos (e por conseguinte, aos “nobres parlamentares”) a possibilidade de deflagar, perante o STF, o processo de impeachment contra Ministros de Estado, por crime autônomo de responsabilidade. Cabe exclusivamente ao Procurador-Geral da República o pedido de abertura de investigação em face de autoridades titulares de foro por prerrogativa de função perante o Supremo Tribunal Federal; somente o PGR pode ajuizar pedidos de impeachment de Ministros de Estado ao STF, e ponto final.

Daí a decisão, cujo dispositivo (parte final) destaco:

” (…) os requerentes não detêm legitimidade ad causam para deflagar o procedimento de apuração de crime de responsabilidade, no campo jurisdicional, em desfavor do Ministro de Estado da Educação. Isso posto, com fundamento no art. 21, § 1º, do RISTF*, determino o
arquivamento da presente petição.”

A decisão do Ministro Lewandowski vai muito além da frustração das expectativas dos “aventureiros” dessa ação, que foi extinta sem julgamento de mérito. Deixa claro que não adianta que outros “nobres parlamentares” ajuízem o mesmo pedido contra Ministros de Estado, por crimes autônomos de responsabilidade, porque essa ação cabe ao PGR. Isso elimina a “ameaça velada” que estava implícita no natimorto pedido de impeachment, qual seja, não dar paz a nenhum Ministro do atual Governo, por razões pífias quaisquer, como as colocadas nesse pedido natimorto!

Vale o recado: já tentaram de tudo, todas as calúnias, todas as mentiras, todas as histerias. Não adianta alegar “meme” de internet no STF, que não cola! Deixem o Governo trabalhar em paz!

[*Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal]

Fábio Talhari, para Vida Destra, 6/3/2.020.

Sigam-me no Twitter! Vamos debater o assunto! @FabioTalhari

9 COMMENTS

  1. Fica claro que o sr da educação estava por trás do pedido.
    Outra, se só o PGR pode ajuizar uma ação, por enquanto, fico no aguardo, por total falta de confiança.
    E, se houvessem tais irregularidades, o presidente mesmo teria demitido o ministro.
    Por ora, esperando os próximos episódios da saga esquerdista. Eles não vão parar, o leite é gordo.

  2. Não tinha ido a fundo nos seus textos…simplesmente brilhante!!! Parabéns pela excelente pesquisa e explanação para leigos leitores como eu e fácil compreensão…o que sugere na minha faixa do dia 15 nas ruas??
    Grande abraço e muita energia para continuar abrindo os olhos de muitos!!

  3. Bom dia amigo Fábio, mais uma vez parabéns pelo EXCELENTE ARTIGO, mais claro impossível!!! Aliás, não vou mais comentar! Vou deixar um comentário para TODAS as suas publicações, elas são sempre ótimas!!! Um beijão!

  4. Olá Fábio bom dia!
    Excelente artigo!
    Parabéns e obrigado por explanar um assunto, que demanda esforço intelectual para ser entendido, com tanta maestria, de forma que, até leigos, como eu, conseguem absorver o conteúdo.

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